Pode.
Engraçado é que essa pergunta não existe para médicos, advogados, engenheiros, enfermeiros.
Engraçado que essa pergunta não existe em outros contextos, como: “pode um psicólogo brasileiro atender um argentino?” “pode um psicólogo gay atender uma pessoa heterossexual?”.
Religião é algo que a pessoa exerce na vida privada, normalmente tem a ver com a forma com a qual a pessoa interpreta muitas das situações da sua vida, orienta hábitos e práticas cotidianas da pessoa. Nós psicólogos temos diversas dimensões que nos atravessam, como raça, orientação sexual, nacionalidade, gênero, estado civil, adoecimentos, ideologia política, etc. A religião é mais um atravessamento que certamente, junto com os outros, constitui a nossa identidade.
Psicologia é uma profissão que, tal qual outras, tem práticas bem orientadas, diretrizes teóricas, código de ética, manuais de conduta. Ao nos formarmos em Psicologia fazemos um juramento e ele precisa ser seguido. Somos treinados para que esses atravessamentos sejam atenuados e neutralizados (embora não sejam inexistentes) na nossa prática profissional.
Num setting terapêutico, o psicólogo tenta dar significado ao mundo a partir do ponto de vista da pessoa que ali se encontra. Se ela é católica, budista, umbandista ou ateia, é a partir desta narrativa que o psicólogo irá trabalhar e realizar o processo terapêutico. Muitas vezes as pessoas buscam identificação e desejam um “psicólogo cristão” ou uma “psicóloga que é mãe” para que ele possa entender mais facilmente suas questões, entretanto, um bom profissional vai saber fazer o deslocamento necessário para que o processo terapêutico flua pra o outro, independente das suas dimensões identitárias. Isso faz parte da fantasia da pessoa de que um psicólogo parecido com ela será melhor.
O ponto aqui é que a religião do psicólogo é útil para ele mesmo em sua vida particular, mas jamais podemos pressupor que será útil para o nosso paciente/cliente. O processo terapêutico é sobre o outro, jamais sobre o psicólogo.
Então, o psicólogo pode ser religioso, sim. Na sua vida particular.

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